
Arte de guerra
19.02.2016 às 10h00

Destruição
O Mosteiro de Santo Elias era o mais antigo santuário cristão no Iraque
CORBIS
O Estado Islâmico está a fazer desaparecer os traços da velha Mesopotâmia. Objetivo: financiar-se e anular a identidade dos povos que ali vivem


s vestígios do berço da civilização estão a desaparecer. Ninguém sabe ao certo o que ainda resta da velha Mesopotâmia. Mas há muitos dados concretos sobre o que já foi destruído em atos deliberados levados a cabo pelo autodenominado Estado Islâmico (Daesh). O grupo extremista muçulmano quer apagar os traços da História, símbolos de uma identidade cultural que pertence a todos num mundo global e a muitas minorias num plano local. O Iraque e a Síria, os territórios que domina, são buracos e destroços quando vistos através de imagens de satélite.
Nesse bocado de terra, entre o Tigre e o Eufrates, nasceram há mais de seis mil anos as primeiras sociedades sedentárias que desde logo construíram cidades-estados. Naquela região do Médio Oriente habitaram sumérios, babilónios, acádios, amoritas, assírios e caldeus. As suas marcas sobreviveram até ao nosso século. Eram sinais inauditos de diversas culturas, hábitos, costumes, modos de vida, artefactos que permitiam conhecer de perto cada comunidade. Eram traços de arquitetura a revelar religiões, crenças, deuses, imperadores, práticas políticas e legislativas, ideologias, modelos artísticos, peças de arte. Tesouros. Mas hoje, se olharmos, por exemplo, para o Mosteiro de Santo Elias (Elijah), o mais antigo santuário cristão no Iraque, alvo de um dos mais graves atentados contra o património cometido pelo Daesh, não conseguiremos ver uma coluna de pé, uma estátua, um altar, nada. As peças foram pilhadas antes da demolição do mosteiro e vendidas a ricos colecionadores de antiguidades algures entre a China, os países do Golfo Pérsico, a Europa ou a América do Norte, os mercados mais ativos no tráfico ilícito da arte saqueada pelos jiadistas.
“Esta prática é de tal forma corrente na Síria e no Iraque, numa associação direta com o financiamento do terrorismo, que a UNESCO a classificou como crime de guerra”, diz Édouard Planche, o número um do Departamento de Tratados sobre Proteção do Património Cultural da UNESCO em Paris. Planche revela os protocolos já assinados entre a sua organização e as forças policiais, agentes alfandegários, juristas, conservadores de museus para “gerir a crise”, ao mesmo tempo que acredita que as campanhas de sensibilização e de contrapropaganda podem vir a ter sucesso. “Há cada vez mais gente a dizer ‘o património é nosso e queremos defendê-lo’. A mensagem dos terroristas não nos impressiona e vamos responder-lhes.” O representante da UNESCO defende que a destruição dos bens culturais pelo grupo extremista “significa que o património se tornou uma arma de guerra, de propaganda e de terrorismo” que é preciso combater com o reforço da legislação em todos os países ocidentais e com a implementação de novas regras no mercado, nomeadamente a proibição de venda de artefactos cuja proveniência seja a Síria e o Iraque.
A RESPOSTA DAS LEILOEIRAS
Essas medidas já estão a ser aplicadas na Europa e nos Estados Unidos, onde grande parte do negócio de antiguidades tem lugar. Mas, por enquanto, ainda só são levadas a sério pelas grandes casas leiloeiras. “A pilhagem de sítios arqueológicos e a destruição de monumentos e edifícios históricos é uma das maiores preocupações do mundo da arte. É por isso que a Christie’s apoia totalmente a campanha da UNESCO. “Queremos cumprir o nosso papel e enviar uma mensagem clara a quem participa no comércio ilegal defendendo veementemente que a propriedade cultural saqueada e traficada vinda das zonas de conflito não pode ser vendida no mercado livre”, esclarece o porta-voz da maior leiloeira do mundo sediada em Londres. “Sempre tivemos o cuidado e despendemos esforços consideráveis na investigação da proveniência dos objetos que colocamos à venda e temos inclusive um programa específico de procedimentos, incluindo o requerimento aos nossos vendedores de um certificado fiável e evidente da origem das peças para que não haja qualquer hipótese de que nos nossos leilões estejam à venda obras vindas de zonas de guerra”, afirma ainda a Christie’s. A Sotheby’s subscreve. O problema permanece, no entanto. A venda desses artefactos é uma realidade nas leiloeiras não oficiais, nos velhos antiquários, através de dealers de arte, e até nos mercados de rua. São modelos diferentes de negócio e atingem preços muito diferenciados. “O material passa por muitas mãos entre a organização criminosa e os compradores de antiguidades, normalmente grandes colecionadores, o que pode acontecer no espaço de um ano, por exemplo, ou demorar 15 anos”, explica o arqueólogo americano Michael Danti, conselheiro do Departamento de Estado dos EUA, a partir de Boston, onde é professor universitário.

“Passámos muito tempo a documentar o mercado negro, o tráfico ilícito, as rotas usadas, os compradores, os traficantes e os colecionadores, e a tentar recuperar antiguidades roubadas. Foi um trabalho gigantesco levado a cabo no ano passado. Antes da guerra civil na Síria já havia tráfico de artefactos históricos e usavam as mesmas rotas e eram os mesmos dealers a contrabandear. O que mudou foi o número de jogadores neste tabuleiro de xadrez. Há muito mais do que há 20 anos, como também há muito mais peças no mesmo tabuleiro”, continua Danti. O mercado negro, considera, é agora muito mais diversificado. As redes sociais, do Facebook ao WhatsApp, são vias privilegiadas para a venda deste tipo de mercadoria. Mas essas transações são sempre de baixo valor. O mesmo acontece nos mercados locais, como o de Istambul (a Turquia é o país por onde passam mais artefactos provenientes da Síria e do Iraque), ou mais alguns no Líbano, e mercados de venda a retalho. “Mas as grandes peças são vendidas de forma muito secreta e de diferentes maneiras”, esclarece o arqueólogo. “E há ainda um mercado direto da Síria para o colecionador.”
A diversidade estende-se também aos compradores, que podem ser “institucionais, individuais, especialistas em moedas, em vidro, em peças arquitetónicas… uns são muitos ricos, outros têm poucos meios, uns gostam de antiguidades, outros não”.
Toda a informação recolhida por Michael Danti, que coordena um grupo de trabalho imenso, tanto nos EUA como no terreno no Médio Oriente, é fornecida ao Departamento de Estado dos EUA, que a “passa às organizações e autoridades que julga serem as mais adequadas”. O sistema funciona bem, garante. Mas não é suficiente para travar os benefícios económicos que o Daesh continua a obter através da venda das pilhagens que faz nos territórios que ocupa.
O número é avançado pela Bureau das Nações Unidas contra o Crime Organizado: “O tráfico de bens culturais representa 1% do montante global do tráfico ilegal de todos os tipos de mercadorias. Estamos a falar de uma verba que oscila entre os três e os seis mil milhões de euros e grande parte dela corresponde aos lucros do Estado Islâmico nesta matéria.” Menos seguros, os americanos ligados a organizações de combate ao crime contra a arte e o património falam de centenas de milhões de euros e garantem que citam o Departamento do Tesouro americano. “O facto é que ninguém sabe ao certo quanto dinheiro o Daesh consegue fazer com a venda de obras de arte saqueadas”, dizem Deborah Lehr e Tess Davis, à frente da Antiquities Coalition, sediada em Washington. “O Conselho de Segurança dos EUA, tal como o FBI e o Departamento do Tesouro, estão preocupados com o montante que o Daesh está a fazer com o tráfico ilegal. Há já um reforço da legislação em todo o mundo para fazer face a estes crimes que se tornaram uma questão de segurança global, uma vez que se trata claramente de uma associação direta entre tráfico e terrorismo”, acrescentam.
AÇÃO DAS AUTORIDADES
Na Europa, a Scotland Yard responde a partir de Londres: “É relativamente comum termos interrogatórios e investigações em relação a alegados roubos ou a antiguidades ilicitamente pilhadas na Síria. Depois de recebermos denúncias, revemos a credibilidade da fonte e verificamos a proveniência das peças. A nossa investigação, porém, restringe-se à área metropolitana de Londres e só temos uma equipa a trabalhar no terreno. Acontece que a maioria das alegações que nos chegam deveria ser encaminhada para autoridades estrangeiras, nomeadamente as dos países onde vivem os suspeitos.”
A Unidade de Arte e Antiguidades da polícia inglesa garante que atuou em três grandes investigações sempre em conjunto com autoridades de outros países e em associação com jurisdições estrangeiras. Não avança pormenores sobre a matéria, por precaução e segurança, mas afirma que “ainda não houve qualquer detenção até à data”.
São normalmente os museus londrinos e os membros da comunidade do mercado da arte e os seus peritos a chamar a atenção da polícia para as peças pilhadas. A Scotland Yard assume que um objeto pilhado de outro país muda muitas vezes de mãos até chegar ao mercado inglês. “Isto significa que a nossa Unidade de Arte e Antiguidades trabalha com toda a frequência com as autoridades estrangeiras no decurso de profundas e longas investigações.”
Em Portugal não se pode dizer exatamente a mesma coisa. A Unidade de Obras de Arte da Polícia Judiciária diz não ter “recebido das congéneres internacionais qualquer informação sobre estas atividades e muito menos da existência de uma rota com passagem pelo nosso país”.
Não é de todo a informação a que o Expresso teve acesso. O professor universitário Michael Danti garante que uma das rotas existentes no contrabando de obras de arte e antiguidades provenientes da Síria e do Iraque passa algumas vezes por Portugal. “O vosso país já recebia material antes da guerra. Trata-se de um território costeiro com um grande tráfego marítimo e é por essa via que é uma porta de passagem para estas mercadorias.” O arqueólogo sublinha, porém, que “Portugal não é um mercado ilícito deste tipo de artefactos, mas está envolvido no tráfico marítimo tanto pela via mediterrânica como atlântica. Portanto, é inevitável que as peças vindas das zonas de guerra passem pelas vossas fronteiras”. Em resposta, a PJ, surpreendida, avança que “está atenta” e que “vai informar-se sobre todas as operações associadas ao terrorismo”.

Michael Danti não deixa ainda de frisar que “Portugal não é um grande peão neste jogo, quando comparado com a Turquia, a Grécia ou a Bulgária”. “Mas é um dos países que têm de manter a vigilância apertada. É um grande ponto de partida para os mercados internacionais de um ou dos dois lados do Atlântico, tal como tem sido desde há 500 anos a esta parte”, avisa.
O Conselheiro do Departamento de Estado norte-americano não tem dúvidas de que quem mais compra são os países ricos, onde há verdadeiramente dinheiro. Daqueles que já citámos — EUA, Canadá, Reino Unido, China, países do Golfo Pérsico —, o que mais o preocupa, diz, é a China. “A grande questão é saber qual é o papel da China neste mercado. É muito difícil monitorizar o que ali se passa. Mas sabemos que os chineses sempre foram grandes colecionadores de antiguidades. O mesmo se passa com os estados do Golfo. Há muita gente rica ali e temos consciência de que muito material vindo da Síria e do Iraque é ali colecionado.” Trata-se de mercados antigos mas que hoje se intensificaram. De tal forma que a venda de arte e antiguidades saqueadas se tornou uma das principais fontes de financiamento do Estado Islâmico. Para a maior parte das organizações, ela é a segunda maior fonte de riqueza do EI, logo a seguir ao petróleo. Mas, outra vez, certezas não há. Portanto, considera Danti, é melhor classificá-la entre os cinco principais recursos financeiros da organização terrorista, entre os quais se destacam ainda a extorsão, os impostos, os raptos e as doações.
PARA QUE SERVE O DINHEIRO
“De facto, o Estado Islâmico faz com a arte dinheiro muito significativo e de extrema importância para o seu modus operandi. Este dinheiro dá-lhe moeda de troca imediata, liquidez imediata, se quisermos, e permite-lhe a lavagem de dinheiro. A pilhagem dá ao Daesh um retorno financeiro inacreditável”, esclarece Michael Danti. O arqueólogo diz que se trata de um fundo extra, pois todo o dinheiro que entra chega de fora do Médio Oriente. “É realmente um financiamento fácil de apoio ao terrorismo e que nós não conseguimos combater com meios e forças militares. Podemos atacar a produção de armas, podemos implodir poços de petróleo e terminar com a sua exportação, mas não podemos acabar com a venda ilícita de antiguidades.” Hatra (monumentos do Período Clássico), Nimrud (esculturas da civilização assíria), Khorsabad (arqueologia assíria), Nínive (a determinado momento a maior cidade do mundo) e o Museu de Mossul (toda a riqueza artística e histórica da região) no Iraque, Palmira (Império Romano) e o Mosteiro de Eliajh (Cristianismo), na Síria, são alguns dos locais mais destruídos pelo Estado Islâmico que Nada al-Hassan, presidente da Unidade dos Estados Árabes do Centro do Património Mundial da UNESCO, cita como as grandes perdas da Humanidade. “A destruição está por todo o lado, a lista é longa, mas estes são os exemplos mais espetaculares e que mais chocam o mundo.” A partir do Observatório para o Património Sírio, sediado em Beirute, Nada faz uma recolha constante de tudo o que se passa na região. “São pilhagens monumentais. As imagens de satélite mostram um território esburacado, ferido. Eles utilizam tudo para destruir, explosivos, bulldozers, martelos pneumáticos… É uma forma de propaganda e ao mesmo tempo a maneira mais fácil de acabarem com as minorias religiosas naquela parte do globo, tirando-lhes as referências culturais e identitárias”, continua Nada al-Hassan.
Os objetos que já saíram ou que ainda estão nos sítios arqueológicos não são na sua maioria conhecidos. “Não conseguimos saber o que foi ou não retirado. Só nos apercebemos disso com as peças que temos encontrado em circulação. E não foram poucas”, diz a presidente da Unidade dos Estados Árabes da UNESCO. São obras apreendidas pelas autoridades turcas e libanesas, na sua maioria, e que foram confiscadas pelos agentes alfandegários. “É-nos impossível chegar a um número mesmo com o trabalho intenso e conjunto com a Interpol.” O departamento que chefia patrocina a continuidade da abertura dos museus que ainda não foram destruídos, enviando dinheiro para que tenham as portas abertas e paguem os salários aos funcionários.
Coisa que já não acontece no terreno arqueológico, de onde desapareceram todos os guias e vigilantes. Aí atuam em simultâneo o Daesh, com os seus próprios meios, homens e equipamentos, e a comunidade local faminta e desesperada. Conseguem uma licença do Estado Islâmico para escavar o terreno e pagam uma taxa de 20% sobre tudo o que encontrarem e venderem. E ainda pagam mais se precisarem de utilizar material do Daesh para fazerem as suas pilhagens.

“Muitos iraquianos e sírios são pagos pelo Estado Islâmico para saquear antiguidades, o Daesh dá-lhes trabalho: roubar a propriedade cultural e traficá-la. E eles são tão pobres que aceitam esse trabalho para alimentar a família”, explica Michael Danti, que esteve no terreno entre 1991 e 2010 a trabalhar como arqueólogo, conhecendo cada sítio arqueológico como as próprias mãos. “O Estado Islâmico percebe o desespero do povo e explora-o. Vende-lhe o futuro.”
Mas o sistema não funciona com toda a população. Há muitos voluntários sírios e iraquianos no terreno “que todos os dias põem a vida em risco para protegerem o seu património cultural”. “São eles que nos pedem ajuda, querem-na, precisam dela para preservar as suas comunidades e as suas identidades culturais”, conta Danti. “Eles compreendem perfeitamente o que está a perder-se. Estão à espera de que a comunidade internacional os ajude. Trabalham no terreno para preservar também a imagem dos sírios, para documentar e inventariar estes crimes e para identificar riscos que possam ser oportunamente reparados. Estão a preparar a reconstrução”, continua o conselheiro do Departamento de Estado norte-americano.
A RECONSTRUÇÃO
A equipa de Danti trabalha em conjunto com estes homens. O objetivo é reabilitar o património danificado e, caso não seja possível, documentá-lo o mais fielmente possível para que a posteridade o possa continuar a estudar. “Estamos a fazer tudo o que é preciso no terreno para dar a conhecer os danos, salvaguardar riscos e conservar o que resta.” Uma das plataformas de ação coordenada pelo arqueólogo tira pura e simplesmente os artefactos dos sítios onde os encontra e escava locais insuspeitos onde os esconde e volta a tapar. “Este tipo de projetos são simples processos para colmatar feridas, combater ameaças no que respeita às antiguidades. Mas também fazemos muito trabalho de conservação e restauro. Na Síria há muitos edifícios de arquitetura extraordinária que já foram danificados e nós temos projetos simples para prevenir a acumulação de mais danos.” O dinheiro sai dos Estados Unidos diretamente para estes grupos de trabalho aos quais é fornecida formação, salários, equipamentos (máquinas fotográficas e não scanners digitais porque estes dão muito nas vistas, entre muitas outras coisas). “É a única forma de fazermos o trabalho!” No entanto, a mediatização de cada ação de destruição contra o património é sempre bem-vinda para o grupo extremista muçulmano que a usa sistematicamente com um fim propagandista, depois de ter retirado de cada monumento ou sítio arqueológico tudo o que lhe servirá de mercadoria valiosa. “Temos que nos focar na reconstrução, sim, mas ter cuidado com a preservação de todos os sítios que ainda estão intactos. Se dissermos quais são os monumentos em perigo pelo seu valor patrimonial, abrimos os olhos aos terroristas, ajudamo-los a ter ideias. Foi o que aconteceu com Palmira. E eles, claro, não quiseram desiludir-nos”, acredita Nada al-Hassan.
Édouard Planche sabe que o trabalho de reconstrução tem efetivamente de ser preparado a partir do exterior — neste momento nem é possível ir à Síria inventariar seja o que for. Sabe que vai ser um trabalho extremamente demorado, que os danos são consideráveis e que a guerra cultural e de propaganda vai continuar. Mas assume a responsabilidade de “a partir do momento em que possamos chegar ao terreno (e já podemos ir ao Iraque) teremos equipas de geólogos, de arqueólogos e de arqueologia preventiva para nos ajudarem”.

Ruínas.
A cidade de Palmira, destruída em maio do ano passado, foi uma das grandes perdas no que respeita a Património Mundial
SANDRA AUGER/REUTERS
Mas Michael Danti pede mais colaborações. “É preciso historiadores de arte com quem possamos trabalhar tanto nos grupos governamentais como não-governamentais, para melhor prevenir a venda de antiguidades e a destruição do património. É preciso uma maior consciencialização do mundo face ao que está a acontecer. No limite, é preciso exterminar o Daesh!”
Nada al-Hassan é mais comedida. “Preocupa-me fundamentalmente a instabilidade e o fanatismo. Isso é a fonte para tudo o resto. É o fanatismo que atrai a juventude que não tem trabalho. E uma das grandes consequências do fanatismo é ocultar a História, o passado, e impor uma visão do mundo radical e que não tem qualquer consciência do que representa a história enquanto documento. O Daesh instrumentaliza o património para ganhar a guerra porque destruindo-o destrói as pessoas ao nível da sua psicologia individual. É uma propaganda com efeito de dominó, passa de um país a outro e a outro.”
Os vídeos de destruição do património são de facto uma forma de recrutamento, acreditam muitos. São uma provocação ao Ocidente, mostrando-lhe que é impotente para os travar, afirmam outros. E são uma manipulação da identidade cultural local mascarada pelo que dizem ser “a purificação” dos hereges, defendem outros ainda. “Vamos ser a geração que perdeu a noção de civilização e vamos ser lembrados por isso. A ancestralidade que estamos a perder e que talvez nunca sejamos capazes de ultrapassar é demasiado importante. Falamos do primeiro sítio do mundo onde se fez lei, onde se rezou, onde se planeou política e estratégia, onde se construiu”, lembram as duas presidentes da Antiquities Coalition, Deborah Lehr e Tess Davis.
Na rua não há petições, na internet também não. Mas a única solução, garantem todos, “é fechar o mercado da arte, ponto final!”
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